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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

OFÉLIO - II

José da Rocha Furtado nomeou Ofélio Leitão para a Procuradoria Geral da Justiça, chefe, portanto, do Ministério Público no Piauí. Para a chefia de Polícia escolheu-se Eurípedes Aguiar. Ao autor destas linhas coube a Delegacia de Trânsito e Costumes de Teresina.

De noite, nas pensões de vida airada, eu me encontrava com Ofélio. Da mesa participava sempre o poderoso Demerval Lobão, diretor da Fazenda. Palestração alegre sobre o trivial político e os aperreios que a maioria adversária da Assembléia e a quase totalidade dos membros do Tribunal de Justiça, presidido pelo corajoso Adalberto Correia Lima, causavam ao novo governo. Bebíamos cerveja até de madrugada. Demerval nos deixava em busca da Helena, boa quenga do seu xodó, num dos subúrbios distantes. Eu e Ofélio convocávamos dois bons gatos para o namoro madrugadino nos quartos do cabaré, nos quais às vezes a gente dormia coma borboleta. Tempos ditosos.

Quase diariamente estes fatos se repetiam, nos lupanares da Gerusa e da Raimundinha. Gostoso ambiente da Rosa Banco estava em decadência. Também freqüentávamos a Calu, alegria da Piçarra, e o boteco amplo do Gôdo, perto da Estação da Estrada de Ferro, muito freqüentado de caboclas de segunda classe. Assim se passavam os tempos. Cerveja na pança, de noite, e fêmeas na cama. A vida que se pedia a Deus. De manhã e de tarde, trabalho. Brincadeiras nessas horas só nos sábados e domingos.

Ofélio muito padeceu nos primeiros meses de Rocha Furtado. Funcionava à direita do presidente do Tribunal, nas sessões [das] quintas-feiras. Os desembargadores lhe negavam atenção, ouviam-no calados, e nunca deram bola aos seus brilhantes pareceres. Era a conseqüência da luta apaixonada em que se envolviam o Executivo e o judiciário. Idealista, o jovem procurador recebia com altivez a atitude deseducada dos magistrados, e cumpria os seus deveres com muita coragem. Era ele um homem honrado. Honesto. Fiel aos princípios que defendeu nas campanhas severas. Nada lhe entibiava o ânimo, embora os seus esforços representassem nenhum valor junto aos desembargadores.

Em Ofélio havia uma virtude irrecusável: a coragem. Depois eu conto mais.


A. Tito Filho, 15/06/1989, Jornal O Dia

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