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terça-feira, 30 de agosto de 2011

ANTIGAMENTE

Teresina foi a primeira cidade do Brasil construída em traçado geométrico, no chão da mata derrubada. As casas de moradia tinham a parede da rua rente com as calçadas. Havia um corredor central, ladeando-o salas e alcovas, a sala de refeição no meio, com peitoris para o saguão, e o célebre puxado de quartos, despensa, cozinha e banheiro. Esta estrutura ainda existe em muitas residências. Depois se construíram palacetes.

Teresina não nasceu espontaneamente, mas de modo artificial, prevendo-se praças e ruas. fizeram-se as edificações mais necessárias, mercado, cemitério, hospital, cadeia. Surgiu o jornal. Criaram-se clubes. Animada a vida teatral. Festivos carnavais. Fundaram-se clubes recreativos. Apareceram os primeiros cafés e restaurantes. Jogo de bilhar, passeio de cavalo. O costume das serenatas. Os festejos religiosos.

Ainda no alvorecer do século XX e nas proximidades de 50 anos, Teresina não tinha serviço d'água encanada nem luz elétrica: comuns os CARGUEIROS d'água que abasteciam as residências, montados no jumento bisonho, estrepando na cangalha gigante. Deliciosos tempos de Teresina doutra. O astro era o acendedor de lampiões - candeeiros no alto dos postes, queimando querosene. Ao lado do desconforto, da poeira, das raras medidas de higiene, da tuberculose e da sífilis, do casebre de palha, a maledicência generalizada na roda de calçada e nos serenos de bailes.

Nos primeiros anos do século, a água encanada. No Governo Miguel Rosa, luz elétrica. Sociedades literárias animavam a cidade. Chegou a era do cinema - o mudo, depois o musicado, finalmente o falado. O jardim, o jardim da Praça Rio Branco, de doce lirismo, rapazes rodando num sentido e garotas noutro para o namoro paroquiano mais gostoso, o namoro dos olhos. Chegaria a vez da Praça Pedro II, do mesmo jeito - olhos dele grudados nos dela.

Correram mais de 50 anos. Teresina crescia mas permaneciam os costumes provincianos. O bom gelado de pega-pinto, o sorvete de gelo rapado, os tipos populares, os freges de panelada, a cidade pacata, dorminhoca às 21 horas, familiarmente. Boa bolinação nos cinemas, em que as normalistas gostosas namoravam apimentadas. E os cabarés da Raimundinha Leite, de Gerusa, da Rosa do Banco, repletos de borboletas fornidas e nos quais se ombreavam desembargadores, estudantes e vaqueiros.

Crime só de longe em longe por motivos passionais as mais das vezes. Raros assassinatos bárbaros. Contam-se, assim, de memória, as mortes do motorista Gregório, do Lucrécio Avelino e do motorista trucidado por Catanã.


A. Tito Filho, 15/08/1989, Jornal O Dia

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