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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

MACAQUICE

Desperdício, roubalheira, esperteza das mordomias, corrupção, doença, fome, miséria, o quadro nacional de malefícios espanta e desespera. Mas vigora também, por parte, a feia e desalentadora macaqueação ou rigorosa imitação da criatividade alheia. Os velhos programas de rádio, nas décadas de trinta e quarenta, tempos áureos de cantores populares verdadeiros, eram imitados dos Estados Unidos, sobretudo, bem assim quase todo o processo televisivo. Sílvio Santos, nas suas apresentações dominicais, corrobora a minha assertiva. A TV norte-americana criou os ensinamentos de práticas rurais e fez do telejornalismo uma das grandes conquistas da comunicação rápida. Nos Estados Unidos surgiram os ricos processos de representantes para auditórios, com os famosos júris de pessoas ilustres, introduzidos entre nós pelo notável J. Silvestre e seguidos por Flávio Cavalcanti, criador também dos NOSSOS COMERCIAIS POR FAVOR, copiados depois generalizadamente. A série de O CÉU É O LIMITE viria ainda dos Estados Unidos.

A TV dos Estados constitui cópia das TVs do Rio e são Paulo. Reproduz-se o que elas enviam como fornecedores. Enlata-se a cultura regional brasileira. Nega-se aos brasileiros a paisagem das unidades federadas. Recusam-se-lhe os cenários sociais das áreas da diversificada geografia humana nacional. Crime ou irresponsabilidade? Aos Estados cabem alguns momentos de jornalismo noticioso e de perguntas e respostas. Tudo copiado das fontes do Rio e são Paulo. Triste, macaqueação perfeita. Terminadas as notícias, os locutores retiram o microfone da lapela, colocam-no em determinado lugar da mesa, um conversa com o outro, riem ambos, risinho sem graça, e rezam o boa-noite, como na invenção do Cid Moreira. A TV Globo começou, a Bandeirantes imitou, outras copiam, e o resto do Brasil, sem idéias novas, copiou. Agora todo noticioso tem um comentarista, que ministra a aula de sabedoria política.

Perdeu-se neste país a originalidade. Macaqueia-se. Vive-se de macaquice. Nada se cria, tudo se copia. Temos até Beverly Hils, numa cidade sem montanhas, defronte dos apartamentos que ficam debaixo da ponte do rio Poty.


A. Tito Filho, 16/07/1989, Jornal O Dia

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