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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

PROGRESSO

Teresina, gostosa, suave, tranqüila, pitoresca, haveria de encontrar os caminhos do progresso sem fim. O Rio de Janeiro deu o exemplo maravilhoso. Derribou os bonitos chalés da avenida Atlântica e as mansões de Copacabana e no lugar surgiu uma das maiores e maus sufocantes selvas de pedras do mundo. A Galeria Cruzeiro, lugar onde se reuniam boêmios e políticos para o chope, dia e noite, foi ao chão. Na área se construiu um espigão de mais de trinta andares. Era a americanização do Brasil. A época das misses de mulheres peladas, dos salgadinhos, dos sutiãs acolchoados, do feliz aniversário, das debutações, do descabaçamento generalizado.

A buliçosa Teresina das pracinhas, do namoro de olhos, do cinema romântico, da roda na calçada, a boa Teresina também copiaria o figurino das megalópoles, ela, a cidadezinha dos sonhos dourados, se transformou em cidade grande, habitada de seiscentas mil almas, de quais quatrocentos mil provieram dos municípios piauienses, gente do interior, cansada, sem terra e sem casa, hoje metida nos espaços miseráveis dos conjuntos habitacionais.

Teresina chegaria ao progresso total, inclusive do pistoleiro, da churrascaria, da sujeira, das praças sem virtude, verdadeiros mercados, noites de gueis e sapatões.

Chegaria a vez dos arranha-céus. E estas já pululam por todos os lugares, sobretudo nas mediações da outrora paisagem de beleza do Rio Poty. Já se criou até uma BEVERLY HILLS, ou BEVERLEY, a mesma cousa, cuja propaganda se faz com retrato de jovens bebendo uísque e as indicações MORAR EM BEVERLY HILLS É UM LUXO, É UM PRIVILÉGIO, É UM PRAZER. De lá, dos apartamentos, os milionários moradores têm a sentimental vista dos residentes sem destino, DEBAIXO DAS PONTES DO POTI, retrato perfeito de uma sociedade doente, repartida entre os felizes, que são poucos, e os arrasados, que são muitos.

O nome correspondente à nossa subserviência do povo mendigo, copiador dos norte-americanos, que nos chupam tudo e nos humilham, mas que devemos imitar, num gesto de homenagem. BEVERLY em inglês é nome de pessoa. HILLS, colinas, cenário de elevações de terreno. BEVERLY HILLS fica em Hollywood, a velha capital do cinema de outrora, bairro de luxo de artistas milionários, donde se avistam montes cobertos de neve no inverno. Esse conjunto de incrível conforto tupiniquim necessita já e já da fabricação de neve e da construção de colinas, pois até agora está de sol abrasador e possui apenas, como paisagem, os morros do QUEROSENE e do URUBU.


A. Tito Filho, 27/09/1989, Jornal O Dia

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