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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

JOÃO ADÉLIA - I

Menino de calças curtas, na minha cidadezinha de Barras, eu muito me divertia nas festas da padroeira, Nossa Senhora da Conceição, que se encerrava no dia 08 de dezembro de cada ano. Eram nove dias de novenas, celebradas pelo padre Uchoa, sacerdote de muitos amigos e que fazia os novenários em várias cidades do interior. No tempo dos festejos, muita gente. Depois das rezas na igreja, havia os animados leilões, com jóias oferecidas e arrematadas pelos fiéis em louvor da santa.

A gente gostava dessa época, principalmente a meninada travessa do meu tope. Pelas cinco da tarde, já eu estava banhado e de fatiota bonita, e me dirigia ao largo da matriz. Comprava rebuçadas que as fazedoras da guloseima faziam em casa e mandavam vender embrulhados em papel de seda. Eram dez balas gostosas numa tira só e cada qual separada da outra pelo embrulho torcido. Custava um tostão ou cem réis, como se denominava a mais humilde moeda metálica brasileira nesses recuados anos a da minha infância.

A grande animação dos festejos estava, porém, na banda de música. Pouco mais das cinco da tarde o bombo chamava os músicos. Fazia-se pequeno ensaio, um por experimentando os instrumentos do seu mister. Assim rumavam para a igreja, pois a novena se iniciava às sete horas. A garotada acompanhava a banda, com entusiasmo, admirando os tocadores mágicos que executavam músicas tão bonitas. Lembro-me de Simplício Paquinha, magro, esguio, tocador de PIFE, denominação popular desse instrumento soprado por uns buraquinhos. Não sei se a memória me trai, mas acho que da banda fazia parte o Paulino, negro novo, batedor de pratos. Tinha um defeito: umbigo se mostrava direitinho como se fosse um pequi, grandão, imenso.

Minha impressão maior vinha de João Adélia, o meu herói do bombardão, instrumento de boca enorme e sons baixos como roncos surdos e abafados.

João Adélia ainda hoje povoa as lembranças que guardei de Barras, cidadezinha do meu nascimento, pequena, de uma comprida rua, o largo da matriz, e uns becos feios, como o da Tripa.

Adélia é outra história.


A. Tito Filho, 20/05/1989, Jornal O Dia

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