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quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A ESTRADA DE BARRO - I

Sobre o trabalho literário de José Fortes de Vasconcelos, com o título acima, o acadêmico Humberto Guimarães escreveu esta abalizada crítica:

"A impressão é de que o autor, não sendo um profissional das letras, acalentou, ao longo dos anos, o desejo de um dia escrever um livro em que deixasse, sob a forma de metáfora, a sua mensagem de experiência e vida: ESTRADA DE BARRO é bem a mostra da essertiva popular de que o homem, para realizar-se, necessário é que plante uma árvore, gere um filho e escreva um livro".

Encontra-se no seu conteúdo o extravasamento de uma grande sensibilidade humana trabalhada com vastidão de cultura informativa adquirida em leituras e observações ecléticas que se vinha sedimentando em superposições de camadas gnósticas, e contidas pelas imposições da responsabilidade de desempenhos profissionais regidos por um caráter de alto senso de dever social, em tarefas alheias ao fazer literário que aguardava, digamos assim vagares para manifestar-se na expressão da linguagem escrita como realização pessoal.

A narrativa é sinteticamente asseada, sem solecismo, sem escravizar-se aos cânones cerceantes da liberdade do estilo; nota-se a presença de preciosismo, é certo, porém isso é perdoável em quem não exerce a literatura como habitualidade; só o exercício contínuo do escritor pode ir afastando esses escolhos que o ímpeto da cultura arrojada, é praticamente impossível de fazê-lo no momento diletante. Anotem-se para exemplos preciosistas os vocábulos onfalópsicos - de pronúncia muito forçada - adrego, choldraboldra, esquipáticos, lugentes, circunscisfláuticos, parvulez, chaveles (?), contemptos, issues (?), entre outros.

Pelo afã de derramar a riqueza das suas aquisições intelectuais, o autor, não contendo a pressa de comunicar todo o seu saber, num processo associativo de fluxo exuberante, encadeia temas diversos num diálogo que se anunciara simples, participando ele mesmo, por vezes diretamente, do confabular dos personagens; nos diálogos, talvez propositalmente, há a dispensação do uso do travessão nas cabeças de frases para indicar que o personagem fala; diga-se, desde logo, que isso pode ser feito sem prejuízo da compreensibilidade, utilizando-se aspas - como, aliás, costumam fazer alguns autores italianos e castelhanos; a propósito lembre-se o escarcéu que a repórter internacional Oriana Falacci fez quando, ao ter editado seu livro "O Homem" aqui no Brasil, percebeu que o editor havia substituído as suas aspas pelo nosso travessão".


A Tito Filho, 22/09/1989, Jornal O Dia

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