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sábado, 24 de setembro de 2011

NATAL

Em Teresina, como em quase todas as cidades brasileiras, o Natal constituía a mais linda festa do ano, significativa por excelência, sobretudo na comunhão espiritual da comunidade. Alegria nos corações. A graça e a beleza artística dos presépios nos templos religiosos - e o Menino Deus vestidinho em camisa muito alva de seda ou de cambraia. A meia-noite a missa do galo, igreja repleta de gente de variada categoria social. Os sinos repicavam mensagens de amor para que todos se fizessem mais irmãos. Depois do ofício divino, no lar de rico aconchego afetivo, a família se entregava, unida em carinho, a ceia natalina, composta do peru morto na véspera e assado nos velhos fornos de barro, com o braseiro bem vivo e ardente. A farofa da ave era uma gostosura. Comiam-se outras iguarias saborosas, preparadas por cozinheiras de doutos conhecimentos nesses assuntos culinários. Não se desprezavam o bom vinho, nem a doçaria de dar água na boca.

Os tempos correram na sua marcha inexorável. A produção industrial aumentou de modo incontrolável. Houve necessidade de vender e vender sempre mais. Inventou-se o rádio. Criou-se a televisão. A propaganda intensa dentro dos lares transformou o Natal num período de angústia generalizada, aperreante, aflitivo, de ânsias para os assalariados na consecução do dinheiro destinado a compra do presente. Esqueceram-se as lições de humildade do Menino da manjedoura de Belém. Cristo passou a objeto das ambições da indústria e do comércio. Avilta-se a beleza do episódio do nascimento. O silêncio da gruta se desrespeita com a barulheira infernal dos anunciantes e dos camelôs de enjoativa palração.


A. Tito Filho, 25/01/1989, Jornal O Dia

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