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terça-feira, 27 de setembro de 2011

POLÍCIA - I

Fui delegado de polícia faz muito tempo no governo Rocha Furtado. Delegado de Trânsito e Costumes. Era de tomar conta do trânsito e dos maus costumes, numa época em que trafegavam poucos automóveis e o transporte coletivo estava começando, nuns ônibus velhos escangalhados. Mas no tocante a costumes, o trabalho se mostrava um pouco desenvolvido. Minha delegacia instaurava processos pelo chamado defloramento de garotas, fiscalizava forrós, cabarés, resolvia casos de vizinhança, enfim instaurava os inquéritos respectivos, quando necessário. Nesse tempo as garotas já estavam sapecas, na classe alta, na classe média, como na classe chamada dos pobres. Nesta última havia constante desvirginamento, ou quebra de cabaço, da forma que se dizia na linguagem de esquina. Participei como delegado de exame nas três classes sociais, no todo 73 meninas, durante um ano, se deitaram na cama da delegacia, abriram as coxas e o médico Hugo Bastos olhava o negócio e atestava os rompimentos. Eu e o escrivão Matias Melo Filho assistíamos ao exame debaixo de muita perturbação de sentidos. Era bom, delicioso ver a cousa bem de perto. De modo geral as defloradas, no correr do inquérito, passavam pelo nosso crivo, meu e de Matias, que nós não éramos deste mundo. Não sei se Hugo Bastos também se metia na aventura de amor sem perigo de polícia. Ainda hoje me encontro com caboclas de cabelo branco e que amei em casebres de palha. Eu e o outro perito na mesma safadeza, meu saudoso mestre Matias Melo Filho, que Deus o guarde na sua glória e sabedoria.

Tempo bom o de delegado. Agora recebi a visita de um colega inteligente, dedicado à polícia, presidente de conceituada associação civil de policiais, o delegado Antônio de Melo Lima. Muito conversamos. A polícia do meu tempo tinha folga, a cidade gozava de paz.

Inexistia o progresso moderno do pistoleiro, da vingança dos assassinatos diários.

Antônio de Melo Lima me contou sobre os vencimentos da polícia do Piauí para enfrentar bandidos. Uma lástima, como se verá do próximo assunto.


A. Tito Filho, 27/04/1989, Jornal O Dia

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